Imagem ex-librisOpinião do Estadão

Repique de inflação e juros

Segunda maior inflação do século alimenta apostas na alta de juros

Exclusivo para assinantes
Por Notas & Informações
3 min de leitura

O Brasil poderá encerrar 2021 com inflação de 6,56%, a segunda maior desde a virada do século, se a disparada dos preços confirmar a última projeção do mercado financeiro e das grandes consultorias. Resultado pior, desde o ano 2000, só ocorreu no final do governo da presidente Dilma Rousseff, com a taxa anual de 10,67% registrada em 2015. Forte aperto monetário, com juros básicos a 14,25%, foi a resposta imediata do Banco Central (BC). A ação do novo governo foi eficaz, os juros começaram a cair e chegaram a 7% em dezembro de 2017. Continuaram em queda depois da eleição presidencial, batendo em 2% em agosto de 2020, mas voltaram subir, neste ano, por causa de um repique inflacionário, e devem seguir em alta, encarecendo o crédito e atrapalhando o consumo.

Diante da nova onda de aumentos de preços, pesadelo para as famílias e desafio para o BC, economistas do mercado elevam as apostas em novo arrocho monetário. Pela estimativa recém-divulgada, no fim do ano a taxa básica de juros estará de novo em 7%. Há um mês a projeção indicava 6,50%. O primeiro degrau da escalada será anunciado na próxima quarta-feira, depois da reunião periódica do Copom, o Comitê de Política Monetária do BC. O próprio Copom, depois da última reunião, havia insinuado um aumento de 0,75 ponto porcentual, igual aos dois anteriores. Não haverá surpresa, no entanto, se a taxa básica passar a 5,25%, com elevação de 1 ponto por causa da aceleração da alta de preços.

A inflação oficial, medida pelo Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), deve superar com folga, pelas projeções correntes, o centro da meta deste ano (3,75%) e também o limite de tolerância (5,25%). Mas a taxa de 6,56%, estimada pelos técnicos do mercado, só será possível se os aumentos ficarem mais moderados. Não há sinal claro de moderação, no entanto, apesar de alguma oscilação das taxas mensais.

Em julho, a prévia da inflação deste mês, medida entre os dias 15 de junho e 13 de julho, ficou em 0,72%. Embora menor que a anterior (0,83%), essa taxa ainda é muito alta e o ritmo permanece incompatível com os limites oficiais. No ano, os preços subiram 4,88%. Em 12 meses, 8,59%. Os dados são do IPCA-15, elaborado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).

A persistência do ritmo acelerado é confirmada por outras instituições de pesquisa, como a Fundação Getulio Vargas (FGV). O Índice de Preços ao Consumidor Semanal (IPC-S) subiu 0,90% na terceira quadrissemana de julho, encerrada no dia 22. No período terminado no dia 15 a alta havia chegado a 0,88%. Os aumentos se intensificaram em quatro das sete capitais cobertas em cada apuração. Em 12 meses o índice geral avançou 8,73%.

Os principais motores da alta de preços têm variado de um mês para outro, mas as pressões sobre as famílias têm permanecido muito fortes, quase sem alívio. Durante algum tempo, desde o ano passado, a inflação mais sensível foi a dos preços da alimentação. Comida cara é sempre uma grave complicação, mas outros aumentos também dificultam seriamente o dia a dia.

Não basta ter arroz e feijão. É preciso cozinhar, e o preço do gás de botijão subiu 3,89% em um mês, segundo o IPCA-15. O custo do transporte público também preocupa seriamente a maioria dos trabalhadores, assim como a tarifa de eletricidade. Com reservatórios muito baixos, por causa da escassez de chuvas, tem sido necessário recorrer à energia, bem mais cara, gerada pelas centrais térmicas.

Parte da inflação tem sido ocasionada pelas cotações internacionais de produtos agropecuários e de minérios. Outra parte dos problemas tem sido provocada pela seca. Mas uma parcela nada desprezível tem decorrido da instabilidade cambial, porque o valor do dólar acaba afetando muitos preços internos. Hoje o câmbio reflete, no Brasil, principalmente as tensões políticas e a insegurança sobre a gestão das contas públicas. Inflação se fabrica também na Praça dos Três Poderes e, de modo especial, no Palácio do Planalto. Essa inflação nenhum banco central consegue deter.