Imagem ex-librisOpinião do Estadão

Rio de Janeiro

Escândalos não podem ser desvinculados da responsabilidade de quem vota

Exclusivo para assinantes
Por Notas & Informações
2 min de leitura

Muitas vezes se afirma que os problemas envolvendo políticos, em especial aqueles relacionados com a corrupção e outros ilícitos, são decorrência de uma legislação muito branda. A causa de tantos escândalos políticos seria um sistema legal falho. Certamente, a lei tem várias deficiências, que devem ser corrigidas. Mas nem tudo é problema da lei – e isso é patente quando se observa a situação do Estado do Rio de Janeiro. Lá vigora a mesma legislação penal de todo o restante do País. No entanto, seja no Estado do Rio, seja em sua bela capital, as autoridades políticas parecem obstinadas em ter problemas com a lei, numa incrível sucessão de governadores e prefeitos envolvidos em escândalos.

Desde o final de agosto, o governador Wilson Witzel (PSC) estava afastado do exercício do cargo por decisão do Superior Tribunal de Justiça (STJ), em razão de suspeitas de mau uso de verbas públicas que deveriam ter sido destinadas à área da saúde durante a pandemia. O Ministério Público Federal o denunciou duas vezes por crime de corrupção, lavagem de dinheiro e organização criminosa.

No dia 23 de setembro, foi a vez de a Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro (Alerj) decretar o afastamento do governador. Por 69 votos a zero, o Legislativo autorizou a abertura de processo contra Wilson Witzel por crime de responsabilidade. Agora, um tribunal misto, composto de cinco desembargadores do Tribunal de Justiça e cinco deputados, vai analisar a cassação de seu mandato. Caso sete dos dez votos forem favoráveis à condenação, o ex-juiz Witzel – que foi eleito em 2018 com o apoio da família Bolsonaro – perderá definitivamente o cargo no Executivo estadual.

Wilson Witzel é o sexto governador do Estado do Rio de Janeiro investigado por corrupção. Nos últimos anos, cinco ex-governadores do Rio de Janeiro tiveram prisão decretada pela Justiça: Moreira Franco (mandato de 1987 a 1991), Anthony Garotinho (1999 a 2002), Rosinha Garotinho (2003 a 2006), Sérgio Cabral (2007 a 2014) e Pezão (2014 a 2018). Condenado 13 vezes, Sérgio Cabral é o único desse grupo que continua preso. Somadas, suas penas alcançam 282 anos de prisão.

Mas a trajetória de proximidade com o ilícito não é exclusividade do Estado do Rio de Janeiro. A capital também segue um perigoso padrão. No dia 24 de setembro, o Tribunal Regional Eleitoral do Rio de Janeiro (TRE-RJ) confirmou, por sete votos a zero, a decisão de tornar o prefeito Marcelo Crivella (Republicanos) inelegível até 2026, além de aplicar-lhe multa de R$ 106 mil.

O colegiado julgou duas ações nas quais o bispo licenciado da Igreja Universal do Reino de Deus era acusado de abuso de poder e prática de conduta vedada. Num dos processos, a Procuradoria Regional Eleitoral relatou que, em reunião com lideranças religiosas em 2018, Marcelo Crivella deu orientações específicas a pastores que tivessem problemas envolvendo o Imposto Predial e Territorial Urbano (IPTU) em seus templos.

O bispo, que tenta se reeleger prefeito com apoio do presidente Jair Bolsonaro, anunciou que vai recorrer da decisão do TRE-RJ. Outro político que ambiciona voltar à prefeitura do Rio de Janeiro é Eduardo Paes (DEM). No início do mês, ele se tornou réu na Justiça Eleitoral por corrupção, lavagem de dinheiro e falsidade ideológica eleitoral. Segundo Eduardo Paes, a propositura de ação neste momento, sobre fatos que teriam ocorrido em 2012, é “uma tentativa clara de interferência do processo eleitoral”. Noutro caso, a ex-deputada federal Cristiane Brasil (PTB), que era pré-candidata à prefeitura do Rio, teve sua prisão preventiva decretada no dia 11 de setembro. A filha de Roberto Jefferson é acusada de desvios em contratos da Fundação Leão XIII, órgão voltado para a assistência social.

É preciso melhorar as leis e realizar uma profunda reforma política. Mas essa sucessão de escândalos não pode ser desvinculada da responsabilidade de quem vota. Numa democracia, é o cidadão quem escolhe o governador e o prefeito. Se em todos os municípios essa reflexão é necessária, no Rio o tema é um pouco mais urgente.