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Todos, sem exceção

A inclusão na educação não pode ser vista como um problema, mas uma oportunidade

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Por Notas & Informações
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Os grandes desafios do nosso tempo – da revolução tecnológica à consciência ambiental e às ondas migratórias – já vinham acelerando movimentos tectônicos que, por um lado, criam oportunidades, mas, por outro, aprofundam fissuras. Um dos efeitos de crises agudas e globais, como a da covid-19, é expor as fragilidades das nossas sociedades, mas também despertar a consciência para suas necessidades mais essenciais. Com mais de 90% dos estudantes afetados pelo fechamento das escolas, “o mundo foi precipitado na ruptura mais sem precedentes da história da educação”, adverte o prefácio do Monitor Global – Inclusão e Educação da Unesco, uma massa de dados distribuídos por 450 páginas, mas que, no fim, convergem para justificar uma verdade simples: a inclusão não é apenas um imperativo econômico, mas moral, “é uma expressão da justiça, não da caridade”.

Da forma mais generalizada de exclusão (pela renda) à mais dramática (por deficiências físicas e mentais), a discriminação na educação pode ser motivada por uma miríade de fatores, como gênero, etnia, localização, linguagem, religião ou outras crenças e atitudes.

Em certa medida, os avanços nas últimas gerações foram sem precedentes. Ainda assim, um em cinco jovens está totalmente excluído da educação. Em países de média e baixa renda, os 20% mais ricos têm três vezes mais chance de terminar o ensino médio do que os mais pobres. Só 10% dos países têm leis que garantem a inclusão plena. Dos países pobres, 40% não oferecem qualquer suporte aos alunos afetados pela pandemia.

À medida que o mundo busca reconstruir seus sistemas educacionais, a Unesco recomenda práticas inclusivas que variam de governança, currículos e formação de professores à infraestrutura e relações entre a família e a escola.

Políticas e programas de financiamento podem ajudar estudantes na forma de dinheiro (por exemplo, bolsas) e isenções de pagamento. Nas últimas décadas a transferência condicionada de renda na América Latina aumentou a escolaridade entre 0,5 e 1,5 ano. Mas o financiamento da educação inclusiva para deficientes requer a complementação de programas direcionados. Mesmo em países mais ricos falta uma maior coordenação entre os ministérios da Educação (responsável por professores, administração escolar e materiais), da Saúde (triagem, avaliação e reabilitação) e os da Proteção Social (para subsídios financeiros). 

Os currículos devem ser relevantes e flexíveis. Quando predominantemente voltados a estudantes privilegiados e certas áreas do conhecimento, surgem as desigualdades de implementação. Ao mesmo tempo, o uso de diferentes currículos com padrões diversos para alguns grupos (como deficientes ou imigrantes) dificulta a inclusão e cria estigmas. As tradicionais avaliações de conhecimento acumulado são essenciais, mas precisam ser complementadas por outras que meçam as dificuldades dos alunos no processo de acúmulo, esclarecendo como alguns aspectos podem ser adaptados para permitir seu sucesso.

A preparação de diferentes tipos de professores para tipos variados de estudantes em ambientes separados é um legado importante. Mas é preciso superá-lo rumo a um modelo mais integral. Antes de tratar de tópicos especializados, as abordagens devem preparar os professores para identificar e confrontar as diversas formas de exclusão – física, social, psicológica ou sistêmica –, que são elementos centrais da formação escolar.

A inclusão não pode ser imposta de cima para baixo. Consultas significativas com as comunidades e com os pais são essenciais. O governo deve coordenar a participação de entidades não governamentais dedicadas aos excluídos para subsidiar o trabalho das escolas. 

“A inclusão na educação significa garantir que todos os estudantes se sintam valorizados e respeitados, e que possam desfrutar de um verdadeiro sentimento de pertencimento”, diz o prefácio do Monitor Global. Trata-se de um processo, cuja chave é a cooperação, mas “o pré-requisito consiste em ver a diversidade dos estudantes não como um problema, e sim como uma oportunidade”.