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Um valentão na Presidência

Bolsonaro reitera sua total ignorância sobre a natureza do cargo que ocupa ao partir para a briga contra um desafeto

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Por Notas & Informações
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O presidente Jair Bolsonaro comportou-se como um valentão de rua ao se desentender com um cidadão que o questionou na saída do Palácio da Alvorada. Ao fazê-lo, Bolsonaro reiterou sua índole truculenta, demonstrando, à vista de todos, sua absoluta incapacidade de aturar críticas, ao partir para a briga contra quem apenas o questionava, além de sua total ignorância sobre a natureza do cargo que ocupa, ao colocar em risco a própria integridade física.

A pessoa do presidente da República representa o Estado, e preservar a vida dessa pessoa equivale, portanto, a preservar o Estado. É por isso que deve haver um robusto esquema de segurança para proteger o presidente, e é por isso, igualmente, que o presidente não pode se expor a ponto de correr risco de vida. É como se, ao assumir a Presidência, seu ocupante perdesse a liberdade de fazer o que bem entende pelo tempo que durar o mandato. 

Parece óbvio, a esta altura, que Jair Bolsonaro não tem consciência do que ele próprio passou a significar ao assumir a Presidência da República. A informalidade é um traço característico de Bolsonaro como presidente, algo que, em si mesmo, não prejudica em nada o desempenho de suas funções – ao contrário, pode até ajudar a aproximar o Estado, que ele encarna, dos cidadãos. Mas a informalidade deve necessariamente terminar quando se impõe o respeito incondicional pela instituição da Presidência, o que inclui, em lugar de destaque, cuidar para que o presidente não se exponha a riscos e para que ele não saia no braço com quem quer que seja.

Por isso, foi chocante ver Bolsonaro esquecer-se do que representa, partindo para cima de um desafeto sem saber quais danos o indigitado poderia lhe causar, e foi igualmente chocante observar a atuação amadora da segurança do presidente, devidamente registrada em vídeo. Era dever dos agentes ali destacados impedir que Bolsonaro estivesse tão próximo de desconhecidos que não tinham sido revistados e, principalmente, evitar que o presidente se atracasse com um deles.

Oxalá tenha sido somente uma falha isolada, e que o presidente esteja seguro o tempo todo, mesmo nos momentos em que, ignorando deliberadamente os limites do bom senso e da liturgia do cargo, age como um desordeiro. E oxalá o presidente se controle da próxima vez, sobretudo fazendo valer suas juras de amor pela liberdade de expressão – aquela que Bolsonaro colocou com um valor maior que a própria vida. Se Bolsonaro invoca a liberdade de expressão sempre que ofende seus adversários nos mais baixos termos e prega golpes explícitos contra a democracia e o Estado de Direito, deve aceitar que essa mesma liberdade se estende igualmente a seus críticos, e de maneira absoluta. 

Mas é preciso deixar claro que, no caso da altercação no Alvorada, o rapaz que interpelou Bolsonaro não estava cometendo crime nenhum; já o presidente, quando ameaça não reconhecer o resultado das eleições ou quando espalha desinformação para minar a confiança nas instituições democráticas, força os limites da legalidade.