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Vendo o jogo de longe

Com juros até negativos, a política monetária já deu a contribuição possível à retomada econômica. É hora de recorrer a outra alavanca

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Por Notas & Informações
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O Brasil ficará fora do jogo, olhando por cima do muro, se governos do mundo rico tentarem reanimar a economia com estímulos fiscais. Medidas fiscais, como aumento do gasto público ou corte de impostos, são as mais eficientes, agora, para evitar novo tombo, segundo economistas e dirigentes do Fundo Monetário Internacional (FMI). O mesmo apelo havia sido lançado pelo presidente do Banco Central Europeu (BCE), Mario Draghi.

Com juros até negativos, a política monetária já deu a contribuição possível à retomada econômica. É hora de recorrer a outra alavanca. Se houver ação coordenada, tanto melhor. A coordenação de políticas deu resultado em 2009, quando as autoridades começaram a combater a crise financeira. Mas empregar dinheiro público para estimular a atividade é só para quem tem algum espaço em suas contas. Não é o caso do governo brasileiro.

Corte de juros e outras medidas monetárias continuarão sendo, no Brasil, as principais medidas de estímulo à economia. A direção do Banco Central (BC) tem declarado sua intenção de afrouxar a política e facilitar o crédito enquanto esse caminho for seguro. A segurança dependerá de uma inflação ainda contida e de expectativas favoráveis quanto à evolução dos preços. Também será prudente levar em conta os vínculos entre juros e ingresso de recursos externos.

Algum efeito da política monetária tem sido visível na melhora das condições de financiamento. Além disso, fontes privadas vêm ocupando espaço crescente na oferta de crédito. São detalhes animadores, mas a economia continua em marcha muito lenta, insuficiente para ampliar de forma significativa a oferta de empregos. A melhora do emprego tende a ser um dos últimos sinais positivos quando se supera uma recessão. Mas será a desocupação brasileira apenas mais uma confirmação dessa tendência? Parece razoável desconfiar dessa hipótese. Três anos depois de terminada a recessão, o desemprego continua elevado e ainda próximo dos níveis observados nos piores momentos. Além disso, é preciso levar em conta o subemprego e o recorde alcançado na ocupação por conta própria. Seria certamente ingênuo imaginar um surto de empreendedorismo no Brasil. Tudo isso reflete, sem dúvida, a perda de impulso da recuperação econômica.

A desaceleração começou em 2018, como efeito de uma combinação de problemas, com destaque para a crise do transporte rodoviário e a incerteza quanto ao futuro da política econômica. Sem horizonte claro e com desemprego ainda elevado, as famílias consumiram com muita prudência, contribuindo para limitar a reativação industrial. Sem mudança de perspectiva, e com o comércio externo perdendo vigor, a insegurança foi realimentada.

Ninguém deve iludir-se com algum avanço observado no investimento empresarial. Isso ocorreu depois de uma queda muito grande e boa parte da despesa de capital deve ter sido para reposição de máquinas e equipamentos e para alguma atualização inadiável. A melhora das condições de crédito e alguma procura adicional de financiamento estão longe, até agora, de caracterizar uma retomada firme dos negócios. Incentivos monetários são sem dúvida muito bem-vindos, mas seus efeitos têm sido limitados. Serão bem mais significativos quando os empresários forem levados, diante de perspectivas melhores, a buscar recursos para mover seus negócios.

Durante um semestre o governo nada fez para animar a economia. Depois, anunciou a liberação, ainda limitada, de recursos do Fundo de Garantia e do PIS-Pasep. Além disso, resta a política monetária. Outras iniciativas, como a eliminação de entraves normativos, só deverão produzir efeitos quando as pessoas já estiverem dispostas a se movimentar. Resultado: até fontes oficiais ainda apostam em crescimento entre 1,8% e 2% em 2020. A pouca melhora observada até agora foi meramente orgânica. O paciente respira e parece reagir. Se continuar, ótimo. Fora isso, qualquer estímulo vindo de fora será muito bem-vindo.